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O Poder da Escuta para a Mudança Comportamental

Feedback pode fazer mais Mal do que Bem.

Referência: Harvard Business School

Guy Itzchakov e Avraham N. (Avi) Kluger

Adaptado por Alberto Martin

O famoso feedback é uma das práticas mais comuns utilizadas pelos gerentes para ajudar os colaboradores a aprender e melhorar. Entretanto, pesquisas revelam que o tal do feedback, na verdade, pode fazer mais mal do que bem. 

Há mais de vinte anos, Avraham Kluger analisou 607 experimentos relacionados a eficiência dos feedbacks e descobriu que estavam, na verdade, piorando a performance das pessoas em 38% dos casos. 

Quando li esse artigo, logo pensei: “lógico, ninguém gosta de críticas”, só que o artigo trata tanto de feedback positivo quanto negativo, foi aí que eu fiquei surpreso. Continuei lendo o artigo para entender onde estava a pegadinha. 

Começou a desenrolar o mistério logo em seguida, quando eles disseram: O problema surge quando o feedback mexe com a noção de identidade, em outras palavras, faz a pessoa questionar a forma como vê a si mesma.

Essa é a razão que faz o tiro sair pela culatra, é o que nós aqui do canal já sabemos, se a pessoa está operando no modo gato, ou se tem predomínio desse perfil. 

Quando o colaborador (gato) recebe o feedback, positivo ou negativo, ele recebe também uma segunda mensagem implícita, a pessoa que está dando o feedback está no comando, está te julgando e o pior, ela tem poder sobre você. Todo mundo sabe que gatos não gostam de receber ordens. A consequência imediata é a pessoa entrar na defensiva e ficar tensa com a sua presença ou com a ideia de que está sendo observada. 

Quando isso acontece, ou seja, quando a pessoa entra na defensiva, a empatia diminui, ela não aceita mais mudar de perspectiva e analisar sob o olhar do outro, ela fica centrada nela própria numa espécie de paranoia.

A tendência, em caso de feedback negativo, é o colaborador desacreditar, desmerecer a pessoa que passou o feedback, encontrar defeitos nela, desqualificá-la, ou na melhor das hipóteses, descredibilizar a mensagem, é aquela história, recebe uma multa de trânsito e xinga o carteiro, rasga a multa pragueja e esquece que estava a 250 quilômetros por hora onde o limite era 50, pessoas.

Dependendo do caso, o colaborador começa a evitar a pessoa que passou a mensagem, mudando de horário de almoço, o restaurante, chegando até a pedir mudança de departamento. Tudo isso em nome da autoestima e da preservação da imagem que tem de si.

Mas como resolver isso? Será que existe alguma forma de mostrar o que se espera de uma pessoa, ainda que de maneira mais sutil e sem causar tanto estrago?

Os cientistas fizeram o seguinte experimento: Convidaram 112 universitários para falar ou ouvir, não havia essa definição de papéis. Colocaram-nos em pares sentados frente a frente e pediram que decidissem quem iria falar e quando o fizessem, essa pessoa falaria por 10 minutos sobre o que pensavam a respeito de renda básica universal, ou sobre algum outro experimento que fosse essencial para os universitários e que deveriam aderir.

Os cientistas instruíram os alunos que se propuseram a ouvir, que o fizessem como se estivessem em seu melhor dia. E secretamente pediram aos ouvintes que respondessem mensagens de telefone, de maneira breve, caso viessem dos pesquisadores. 

E aleatoriamente, mandaram mensagens de texto com o objetivo de distrair metade deles e também para que fossem vistos mexendo no telefone enquanto “escutavam”. 

As mensagens continham a seguinte pergunta: “Qual evento recente te deixou mais irritado? Obviamente os alunos foram instruídos a responder, de maneira breve, as mensagens que recebiam dos pesquisadores.

Depois do experimento, os cientistas perguntaram para os alunos, cujo papel foi falar, se estavam preocupados com o que os parceiros de atividade pensavam sobre eles. Perguntaram também se tinham tido novas ideias durante a experiência e também se estavam sentindo segurança em relação ao seu posicionamento sobre os assuntos que abordaram.

E descobriram que os alunos que tinham o papel de falar e que fizeram o exercício com bons ouvintes, em relação aos que foram distraídos pelos cientistas, sentiram menos ansiedade e mais consciência de si após a experiência. Além disso, reportaram maior clareza a respeito de seu posicionamento em relação aos tópicos. Ainda sobre a relação dos alunos que falaram e os bons ouvintes, outro ganho foi relatado, os alunos que falaram, sentiam vontade de compartilhar seus posicionamentos com outras pessoas, o que no segundo grupo, o de maus ouvintes, foi consideravelmente menor. 

Outro benefício da experiência com pessoas consideradas bons ouvintes foi a maior percepção dos dois lados da argumentação, ou seja, ao falarem sobre os tópicos ganhavam maior compreensão sobre os contra argumentos, o que foi chamado pelos cientistas de complexidade de posicionamento. Em outro estudo, os cientistas constataram que pessoas que falam com bons ouvintes têm posicionamentos mais complexos e menos parciais, em outras palavras, mais amplos.

Em outro estudo, os cientistas instruíram 114 universitários do curso de administração a falar por doze minutos sobre suas aptidões para tornar-se um administrador no futuro. Aleatoriamente, os cientistas mandaram os alunos que se dispuseram a falar para três grupos: ótimos, medianos e péssimos ouvintes.

O grupo de ótimos ouvintes era composto por gerentes experientes e qualificados, coaches e alunos treinados da disciplina de assistência social. Eles foram instruídos a usar suas habilidades de escuta, fazer perguntas e reflexão. O grupo formado por ouvintes medianos era composto por alunos de administração de empresa e conversou com os universitários do experimento como estavam acostumados a fazer, ou seja, sem nenhum treinamento especial. Já o grupo de péssimos ouvintes era composto por alunos de artes cênicas, que tinham sido instruídos a mostrar desinteresse, olhando para os lados durante a interação ou ficar mexendo no smartphone.

Após as conversas, pediram para o grupo dos universitários que falaram, que respondessem à seguinte pergunta: O quanto se consideravam aptos a tornarem-se gerentes. Com base nas respostas, calcularam a complexidade de posicionamento (se perceberam suas virtudes e fraquezas e se achavam que elas afetariam a habilidade gerencial). Calcularam as respostas que indicassem uma visão menos ampla, carregada somente de um posicionamento. O que os cientistas descobriram foi que, os alunos que falaram com os especialistas conseguiram perceber melhor as suas virtudes e fraquezas, em relação aos outros dois grupos. Os alunos que conversaram com o grupo de atores, os piores ouvintes, perceberam majoritariamente suas virtudes e ignoraram quase que na totalidade as suas fraquezas. Interessante salientar que os alunos que falaram com o grupo dos piores ouvintes foi também o grupo que, em média, reportou o maior sentimento de adequação à posição de gerente, ou administrador.

Os cientistas testaram a relevância dessas descobertas em três diferentes campos de estudo: Funcionários da prefeitura, empresas de tecnologia e professores num total de 180 pessoas. Nesses estudos, pediram que os funcionários falassem sobre seus colegas de trabalho, supervisores ou sobre alguma experiência relevante que tiveram no trabalho. Havia dois momentos, antes e depois de participarem de uma rodada de escuta,  uma atividade em que os funcionários são convidados a falar aberta e honestamente sobre um assunto, algo como uma experiência relevante que vivenciaram no trabalho. Todos os que passam por essa atividade são instruídos a não interromper e somente uma pessoa fala por vez.

Os resultados dos estudos foram, mais uma vez, conclusivos e confirmaram os resultados dos outros dois. Quando comparados, o grupo dos colaboradores que participaram da rodada de escuta reportaram queda na ansiedade social, maior complexidade de posicionamento e queda na parcialidade de opinião em relação a assuntos profissionais (tais como postura e posicionamento gerencial), em relação ao grupo que não passou pela experiência da rodada de escuta com bons ouvintes.

Os estudos sugerem que uma boa escuta relaxa os colaboradores, propicia maior autoconsciência sobre suas virtudes e fraquezas e diminui a tendência de pensar defensivamente, o que os deixa mais propensos a colaborar com os colegas. Demonstram maior interesse em compartilhar suas ideias, mas sem a intenção de persuadi-los a pensar da mesma forma, bem como considerar outros pontos de vista.

O objetivo do estudo, segundo seus autores, não é substituir o feedback pela escuta, em vez disso eles constataram que ouvir os funcionários falarem sobre suas experiências antes do feedback pode dar melhores resultados, porque assim eles se sentem mais seguros e menos defensivos.

O Lado Controverso da Escuta

Os estudos também revelaram que os líderes que escutam em são vistos como líderes humanos, o que proporciona maior confiança, ganho na criatividade da equipe e maior taxa de satisfação no trabalho. Então por que não é a prática padrão? Por que os funcionários não ouvidos da forma como gostariam? As pesquisas mostram que as seguintes razões:

  1. Perda de força: Uma pesquisa da mesma equipe de pesquisadores que orientou esse estudo concluiu que os líderes sentem que ao ouvir os funcionários serão vistos como fracos. Ainda que bons ouvintes tenham mais prestígio. Aparentemente os líderes precisam achar o equilíbrio entre a intimidação e admiração.
  2. Escutar consome tempo e energia: Em muitas instâncias, os líderes escutam sus liderados sob a pressão do tempo, às vezes distraídos por outros pensamentos ou pelo próprio trabalho. Escutar é como fazer investimento, para ganhar precisa arriscar.
  3. Medo da Mudança: Bons ouvintes precisam entender a perspectiva do outro sem julgamento, o que é o certo, o problema é mudar de ponto de vista e mudar a postura, em última análise deixar-se influenciar. Os pesquisadores perceberam que muitas vezes que treinaram os líderes para ouvir verdadeiramente, eles tiveram percepções novas e valiosas sobre os colaboradores e ficaram surpresos com o quão pouco sabiá sobre a vida de pessoas com quem trabalhavam havia tanto tempo.

Exemplo: Muitos líderes reportaram que quando tentaram entender porque alguém estava faltando tanto, descobriram que a pessoa estava passando por muita dificuldade e que estava ajudando a família (a esposa estava doente, terminal de câncer, um irmão com problemas mentais) Essas constatações abalaram a postura e o ponto de vista dos líderes sobre si mesmos. Uma experiência que chamamos de dissonância cognitiva e que não é fácil de lidar.

Dicas para Tornar-se um Ouvinte Melhor:

Exercitar a escuta é como exercitar um músculo, requer prática, treinamento, esforço e o mais importante, a intenção de tornar-se um bom ouvinte.

  •  Acalme a mente e livre-se dos ruídos internos e externos;
  •  Se não for possível silenciar os pensamentos e dirigir a atenção para o interlocutor, procure um outro momento para ouvi-lo. 
  •  Dê 100% de atenção para a pessoa o que está dizendo;
  •  Desligue ou deixe os eletrônicos em outro lugar;
  •  Mantenha o contato visual, ainda que eles não olhem para você, de vez em quando vão olhar para confirmar se está prestando atenção;
  •  Não interrompa seus interlocutores;
  •  Espere que eles terminem o que disseram ou concluam a ideia, então você fala;
  •  Sem julgamentos ou avaliações: Evite tirar conclusões precipitadas sobre o que está ouvindo. Os julgamentos virão, mas não se ocupe deles.
  •  Se perder a concentração, desculpe-se e peça para que repitam. Fingir que está ouvindo é pior;
  •  Não imponha seus pontos de vista ou soluções: O papel do bom ouvinte é permitir que a pessoa consiga, por ela própria, chegar às suas conclusões;
  •  Se tiver uma excelente ideia, use linguagem de sugestão, exemplo: Enquanto eu te ouvia, me ocorreu algo que eu gostaria de compartilhar você, o que aconteceria se você… 
  •  Faça boas perguntas: Bons ouvintes conduzem a conversa fazendo perguntas que trarão benefício para quem está falando;
  •  Ser um bom ouvinte é prestar atenção ao que não está sendo dito diretamente, porque a pessoa ainda não tem a clareza de que precisa. Assim procure fazer as perguntas que possivelmente a pessoa ainda não fez, mas com o intuito de lançar luz, e não dúvida. Ajude-os a pensar;
  •  Antes de fazer uma pergunta, pergunte para você mesmo: Essa pergunta tem o objetivo de ajudar o meu interlocutor, ou satisfazer a minha curiosidade? Não problema em ter curiosidade, mas o foco da escuta é ajudar a pessoa;
  •  Uma boa pergunta é: Algo mais?

Reflexão: Quando terminar uma conversa, pense na sua escuta. Você perdeu alguma oportunidade, ignorou algum ponto importante, falou em algum momento que poderia ter ficado em silêncio? Quando chegar a conclusão de que fez um ótimo trabalho como ouvinte, faça o balanço dos seus ganhos com o “exercício” e se pode fazer o mesmo tipo de trabalho em situações ainda mais desafiadores.

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