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Ladrão ou Menino?

Essa é a história de um marceneiro muito eficiente e preocupado com seus prazos. E de um menino que morava perto de sua oficina. O marceneiro tinha excelente reputação no mercado e orgulhava-se de entregar seus móveis e objetos de decoração sempre antes do prazo. O menino era alegre e saudável, fazia as coisas que os meninos fazem, corria, brincava, bastante curioso e que estava sempre por ali.

Certa vez, uma encomenda importante se tornou um grande desafio para o marceneiro, ele tinha sido recomendado como o melhor da região. A expectativa era grande, afinal o cliente era um magnata recém-chegado na cidade. A mesa decorativa, que ficaria na sala de visitas da família e os objetos de decoração eram o assunto do momento.

O cliente foi logo dizendo, gosto muito de receber pessoas, meus convidados são sempre bem tratados. É como minha santa mãezinha sempre dizia, o que não parece com o dono é roubado. Quero uma mesa que pareça comigo e com a minha família. Me disseram que você é um artista e que tem sensibilidade de perceber a essência das pessoas. Por isso não importa o preço, eu quero uma mesa linda, que mostre a nossa essência.

Uau, que chance, que oportunidade, que desafio. E lá foi ele para a sua oficina. Fez vários projetos, alguns lembrando do homem, lembrando do que a santa mãezinha dizia, outros pensando na casa, na sala, etc. Finalmente chegou ao projeto ideal e trabalhou com muito esmero para criar uma mesa que superasse todas as expectativas do seu novo cliente.

O menino estava sempre por ali e percebeu que o marceneiro estava diferente, mais calado, mais tenso e até nervoso. Desenhava alguma coisa e depois amassava o papel e jogava no chão, depois desenhava outra coisa, olhava por um tempo, coçava o queixo, às vezes atrás da cabeça e depois amassava e jogava fora novamente, isso se repetiu por alguns dias e menino ficou curioso, o que será que ele está desenhando? Será que eu posso dar uma olhadinha? Mas como seus pais diziam, não mexa no que não é seu, não fique por aí tagarelando, não é educado interromper os outros, muito menos um homem trabalhando.

A mesa estava quase pronta, faltavam somente uns detalhes, um ajuste aqui, um encaixe ali. Então abriu sua maleta de ferramentas, para usar o formão, mas não encontrou, sem ele, nada feito, a mesa ficaria desalinhada. Começou a revirar a oficina, olhou ao redor da casa e não achou.

O menino ficou cada vez mais curioso, o que será que ele quer, será que quer mais papel para desenhar? Ou será que quer um apontador para aquele lápis esquisito? Aliás, por que será que o lápis dele é achatado? A curiosidade era tanta que acabou se aproximando para saber o que tanto o homem procurava, certamente devia ser importante.

Quando o marceneiro o viu, pensou. Muito estranho, por que será que esse menino está me olhando? Já sei, foi ele quem pegou o meu formão, foi ele, só pode ser.

  •  Oh menino, você viu meu formão?

O menino assustou e negou com a cabeça.

  •  Tem certeza?

Fez que sim. Na verdade, nem sabia o que era formão, talvez fosse o nome do apontador para lápis achatado.

O marceneiro estava com pressa e simplesmente virou as costas e continuou procurando, sem sucesso. Pensou: – Não posso atrasar com esse cliente, ele tem uma festa hoje a noite e é todo vaidoso, não posso esperar mais, vou comprar um formão novo e arrumo quando chegar na casa dele.

Enquanto colocava a mesa e algumas peças decorativas na caçamba da picape, viu o menino olhando novamente e pensou: Tenho certeza que esse moleque roubou o meu formão, ele está me olhando muito, dê certo, está se divertindo com o meu sofrimento. 

Quando o menino viu o marceneiro olhando, sorriu sem graça.

Eu Sabia, pensou, ele está rindo da minha cara, ladrãozinho, tá na cara dele, sorriso maroto, próprio de um ladrãozinho. Mas deixa pra lá, eu tenho que entregar a encomenda, depois eu me acerto com ele e com o pai dele, de certo deve culpa do pai, onde já se viu deixar um moleque desses mexendo nas coisas dos outros. Esse mundo está perdido.

Pegou a maleta de ferramentas e trancou dentro da oficina, olhando diretamente para o gatuno e entrou no veículo, batendo a porta. Quando deu a partida e quando foi soltar o freio de mão, sentiu uma pontada no pulso. O formão estava lá caído, entre o banco e a alavanca do freio. Ele sentiu um alívio misturado com alegria, ah que bom, achei o meu formão, disse.

Enquanto manobrava para pegar a estrada, olhou para o lado e viu o menino, curiosamente, já não tinha mais aquele olhar furtivo, malandro, típico de sujeito à toa, ele tinha voltado a ser somente um menino alegre, saudável e bastante curioso, que fazia as coisas que os meninos fazem, corria, brincava e estava sempre por ali.

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